8.05.2011

Balada da cidade triste


I

Saliente manhã
nas torres da praça
cinzenta de tédio
ou sono trocado
por verde e castanho
o tom deste dia
já gasto ainda antes
do uso o tomar
Calados os lábios
que novas nos trazes
passageiro trémulo
de mala tão velha
com longas perguntas
do país sonhado?
Sabemos o gosto
da verde romã
Trincámos o fruto
sem saber a forma
Igual é possível
ao rosto do dia
que cresce em metade
de frio
ou de fome
A longa viagem
espera o seu tempo
Em sangue marcada
a custo estancado
Retomo Outubro
em espera adiada
na véspera de nunca
partir ou ficar
Inverno! Ó Inverno!
Meu país cifrado!
As pedras
e a erva
crescendo nas ruas
da cidade morta
ontem metralhada
e ontem enterrada
nascendo às sete horas
na praça cinzenta
nos bancos de palha
de eléctricos sujos
da cor do limão
Na cidade triste
já morrem palavras!


II

Na triste cidade
de tristes cafés
de chuva a cair
nos olhos doridos
de tanto sofrer
são mesmo os sorrisos
trocados a medo
a sombra tão vaga
de pura alegria
que eu sei
e tu sabes
ser falsa esta música
no meio da praça

Na triste cidade
cidade em escadas
desenho de vento
no arco das pontes
luzeiro de ruas
uma vez por ano
Talvez por engano
talvez seja vinho
eu sei
e tu sabes
madrugada vem
cansados os gestos
da noite alegria
regressa o cinzento
a névoa
e a bruma
Dom Sebastião
num barco rabelo
virá
com tristeza
saber que morreu

Eduardo Guerra Carneiro