2.11.2007


Beatrice


Nem visão, nem real: amor! amor somente!...
Pois quem sabe o que diz esta palavra - amor -?
Quando deixa cair no peito esta semente,
Diz o que há-de brotar, acaso, o Deus-Senhor

Somente amor... Somente?! e pouco esta palavra? Duas silabas
só- em pouco um mundo esta -
Loucos! mas, quando o amor se expande, e cresce, e lavra,
Bem como incêndio a arder, tão pouco inda será?

Gota, que alaga o mundo! átomo, e após, colosso!
Mas este nada ou mundo, a mim quem mo aqui pôs!
Foi Deus! de Deus me vem... e a Deus medir não posso:
E imenso o que vem dele... os nadas somos nos.

E o nada, que me abriu no peito e, feito imenso,
O encheu, bem como um vaso, abrindo, encheu a flor,
Ha-de alagar teu peito e ser do templo incenso...
Mulher! hás-de escutar, que eu vou falar d'amor!

Falar d'amor?!... se ele e como uma essência,
Que nos perfuma, sem se ver de donde...
Se ele e como o sorriso da inocência,
Que inda se ignora e, p'ra sorrir, se esconde...

Se e o sonho das noites vaporoso,
Que anda no ar, sem que possamos ve-lo...
Se e a concha no oceano caprichoso,
Se e das ondas do mar ligeiro velo...

Se e suspiro, que oculto se descerra,
Se escuta, mas se ignora de que banda...
Se e estrela, que manda a luz a terra,
Sem se ver de que paramos a manda...

Se e sonho, que sonhamos acordado...
Suspiro, que soltamos sem senti-lo...
Sopro que vai dum lado a outro lado...
Sopro ou sonho, quem pode repeti-lo?

Falar do amor... do amor! o sempre-mudo!
Se e segredo entre dois, como dizê-lo,
Sem divulga-lo, sem que o ouça tudo?
Se e mistério encoberto, como vê-lo?..

Antero de Quental