1.22.2011

Cristal



Levantámo-nos da cama,
arrastando os lençóis pelas ruas.
É urgente encontrar um café,
encontrar uma mesa a um canto no telheiro
e ter com quem não falar.
Daquela esplanada os monumentos são excessivos.
O barroco enche-nos a boca de pedras.
Para as árvores, cultismo, conceptismo, é brisa
e o sol encima-se na talha azul acordada.
Mais um, outro. A estatuária fonte não seca.
Evitamos a sentimentalidade do cristal,
a desusada lágrima pública,
para que caia no poema em segredo.
Vem enfim o café servido por anjos. O alívio.
Um cigarro que nos conte das cinzas pulmonares
em trabalhos de restauro e contrabando.
A paisagem é interior e facciosa em milhares de degraus.
Mesmo quando nos levantamos, descemos.


Ana Salomé