7.18.2009

Quieres verme bailar?


Morena, só brilhante o cabelo
e a blusa de licra
rente aos seios, do ventre
uma penugem adivinhada
junto ao vazio de onde se soltou
há quinze anos,
deixa que a música se instale
entre suor e suor,
ronda-que-ronda de corpos
vindos do sono bom da tarde,
da luz longa do dia,
do adormecer do sol.
Está sozinha, o busto antes de tudo,
as coxas assentes na bancada,
as mãos no rebordo de madeira,
medindo os passos hesitantes,
os braços que se evitam,
os olhos que se espreitam,
ronda-que-ronda de lutos
e de esperanças - me quieres?
Quieres verme bailar?
E, súbita, rompente e esbelta, em espiga,
ergue-se num sopro,
a nua ponta dos pés na areia de que se fez,
e um hábito antigi
a embala,
numa cadência de tragédia, de saliva e de todos
os cheiros bons
que o seu corpo exala,
as ancas derramadas da cintura,
o olhar por acaso distraído,
os dedos de arabesco em carne pura
troçando, para nós, o desejo
de dançar.


António Mega Ferreira