10.23.2009

1619



Da terra negra à terra vermelha
por noites e dias fundos e escuros,
como os teus olhos de dor embaciados,
atravessaste esse manto de água verde
- estrada de escravatura
comércio de holandeses

Por noites e dias para ti tão longos
e tantos como as estrelas no ceú,
tombava o teu corpo ao peso de grilhetas e chicote
e só ritmo de chape-chape da água
acordava no teu coração a saudade
da última réstia de areia quente
e da última palhota que ficou para trás.

E já os teus olhos estavam cegos de negrume
já os teus braços arroxeavam de prisão
já não havia deuses nem batuques
para alegrarem a cadência do sangue nas tuas veias
quando ela, a terra vermelha e longínqua
se abriu para ti
- e foste 40'L esterlinas
em qualquer estado do SUL -

Francisco José Tenreiro (poeta sãotomense)