10.24.2009

Para que se possa salvar a Literatura



Gosto das personagens que morrem
antes do fim das histórias. É a vida.
As que sobrevivem estão condenadas
a um purgatório do qual
nenhuma ficção as resgatará.
As personagens devem ser como os remédios:
devem ter um prazo de validade.
Não gosto que se pergunte:
o que terá acontecido a Bernardo
e a Luísa depois daquele drama?
Há questões que a literatura não pode
nem deve deixar em suspenso. É fatal.

Hoje escreve-se já para a segunda edição,
para a cinta que proclama o êxito,
para a entrevista na revista do semanário,
para o império da banalidade.
A sofreguidão do novo leva o mercado
a chamar escritores a alguns transeuntes
que acidentalmente decidiram
fazer da literatura um rendimento fixo,
uma escada em espiral para a glória
dos consultórios de dentista.

Nestes casos particulares deviam ser as personagens
a exterminar os autores. Para quê?
Para que se possa ainda salvar a literatura.


José Jorge Letria